Macau, China, 31 mar 2021 (Lusa) – Os Estados Unidos indicaram que um dos principais problemas de direitos humanos em Macau em 2020 foram interferências nas reuniões pacíficas e liberdade de expressão, como a proibição de uma vigília sobre Tiananmen e o cancelamento de uma exposição.
No relatório anual sobre direitos humanos do Departamento de Estado norte-americano, divulgado na terça-feira, aponta-se que em Macau a lei prevê as liberdades de reunião e associação pacífica, mas que as autoridades limitaram esses mesmos direitos à população.
“Os defensores dos direitos civis alegaram que as condições de reunião se tinham tornado mais restritivas devido a obstáculos processuais, incluindo a proibição de reuniões, o registo de manifestantes num curto espaço de tempo e a detenção de potenciais participantes em locais de protesto”, lê-se no relatório.
A título de exemplo, os EUA recordaram a proibição pela primeira vez em 30 anos da vigília em memória do massacre de Tiananmen.
“Em maio, a polícia alegou as preocupações com a pandemia covid-19 [para a proibição], apesar de não haver novos casos em 42 dias”, lê-se no relatório.
Na noite de 04 de junho de 2020, as autoridades montaram uma operação e acabou por deter duas estudantes, filhas do deputado pró-democracia de Macau Au Kam San, com os agentes a apreenderem duas velas e um livro sobre Tiananmen.
Hong Kong e Macau são os únicos locais na China onde têm sido autorizadas manifestações sobre o massacre de Tiananmen, um acontecimento que continua a não ser reconhecido por Pequim.
No mesmo relatório, os Estados Unidos denunciam que “o Governo, por vezes, restringiu” ao longo de 2020 a liberdade de expressão, inclusive para a imprensa.
Um dos casos que os Estados Unidos recordam remonta a outubro de 2020: uma exposição de imprensa internacional com fotografias dos protestos pró-democracia de Hong Kong de 2019 foi inaugurada em 25 de setembro e deveria decorrer até 18 de outubro, mas esta foi encerrada, sem aviso prévio.
Na altura, recordaram os norte-americanos, a Associação de Imprensa em Língua Inglesa e Portuguesa de Macau (AIPIM) também lamentou o encerramento antecipado da exposição da World Press Photo em Macau. “Se o encerramento estiver relacionado com pressões em torno de algumas fotografias da exposição, a AIPIM considera que estaremos perante algo de grave e um episódio preocupante que sinaliza uma erosão do espaço de liberdade de expressão”, assinalou, na altura, a associação do território.
As autoridades dos EUA mencionaram ainda que a Assembleia Legislativa de Macau aprovou, em agosto, um novo regime de proteção civil que prevê a criminalização da difusão de “informações falsas”, um crime que suscitou críticas de deputados e juristas.
O “crime contra a segurança, ordem e paz públicas em incidentes públicos de natureza súbita” pune “quem produzir ou disseminar informações falsas, com intenção de causar alarme ou inquietação pública”, com pena até dois anos de prisão ou multa de até 240 dias.
“Os legisladores e outros que se opuseram à lei expressaram a preocupação de que poderia restringir a liberdade de expressão e de expressão”, denunciaram os EUA.
Quanto à liberdade de imprensa em 2020, os Estados Unidos frisam que “os meios de comunicação social praticaram por vezes autocensura, em parte porque o Governo subsidiou alguns meios de comunicação social”.
No relatório, recorda-se ainda o reforço da videovigilância e cibersegurança, bem como o reforço de leis em Macau para assegurar a boa utilização e proteção da bandeira, emblema e hino chineses (prevendo pena até três anos de prisão a quem publicar e intencionalmente ultrajar os símbolos e representações do país).
“Novas capacidades de reconhecimento facial foram acrescentadas ao sistema de vigilância pública, suscitando preocupações entre advogados e legisladores pró-democráticos de que as capacidades iriam além do âmbito legal. Os defensores da pró-democracia alertaram que o sistema pode dissuadir as atividades políticas”, lê-se no relatório.
Ainda assim, segundo os Estados Unidos, o Governo respeitou ao longo de 2020 a independência e imparcialidade judicial.
A transferência da administração de Macau para a China ocorreu no final de 1999, dois anos depois de Pequim ter recuperado a soberania sobre a antiga colónia britânica de Hong Kong.
As duas regiões têm autonomia em todas as áreas, exceto na diplomacia e na defesa.
Na lei básica de Macau, miniconstituição do território que deverá estar em vigor até 2049, lê-se que a RAEM tem o direito “a exercer um alto grau de autonomia e a gozar de poderes executivo, legislativo e judicial independente”.
MIM (JMC) // VM
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